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Cães e gatos também podem ter demência?

20 Fev 2024 - 10:13
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Cães e gatos também podem ter demência?

Com o avançar da idade, alguns animais de companhia começam a apresentar sinais de desorientação e défice de memória que podem ser comparados com a demência nos seres humanos. Serão estes sinais sintomas de um défice cognitivo nos cães e gatos? E a doença é semelhante à dos humanos?

Os cães e gatos desenvolvem demência como os humanos?

Os cães e os gatos podem desenvolver uma condição muito semelhante à demência ou à doença de Alzheimer nos seres humanos. Esta condição é designada por síndrome da disfunção cognitiva.

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Os animais com disfunção cognitiva apresentam “alterações neurodegenerativas no encéfalo semelhantes às dos humanos com doença de Alzheimer”, explica ao Viral o médico veterinário João Carlos Ribeiro, diretor clínico da Referência Veterinária e docente convidado na Faculdade de Medicina Veterinária na Universidade Lusófona.

“Tal como nos humanos, o declínio cognitivo pode estar associado a alterações na circulação sanguínea cerebral, a tumores, a inflamação e a doenças metabólicas”, prossegue o especialista.

A par com o declínio cognitivo, os indivíduos seniores (tanto humanos como animais) podem também sofrer “perda de audição/visão ou problemas osteoarticulares”, o que dificulta o diagnóstico da disfunção cognitiva.

No mesmo sentido, Ângela Martins, especialista em neurorreabilitação no Hospital Veterinário da Arrábida e coordenadora do curso de Enfermagem Veterinária na Universidade Lusófona, afirma que a disfunção cognitiva nos animais “manifesta-se de uma forma muito semelhante à das pessoas”, principalmente no que toca ao avanço “progressivos” dos sintomas.

Um artigo científico sobre a síndrome de disfunção cognitiva em cães e gatos avança que “a maior parte dos mamíferos apresenta evidências de envelhecimento do cérebro e consequente défice cognitivo”. Os investigadores sublinham que, nos animais de companhia, esta síndrome “tem um progresso paralelo à Alzheimer em vários aspetos”.

A semelhança entre os cães e os humanos é tal que os investigadores consideram que os cães “são um modelo natural para investigar a cascata de eventos do envelhecimento e estágios iniciais de Alzheimer nos humanos”. 

Um artigo publicado em 2012 já referia que os estudos científicos em cães permitem “validar terapias inovadoras” devido à semelhança entre os sistemas imunitários das duas espécies.

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Tanto em animais como em humanos, esta condição está relacionada com doença vascular cerebral e com a progressiva acumulação da proteína beta-amiloide no cérebro

“Nos cães, gatos e humanos séniores existem semelhanças na deposição de proteína beta-amiloide em placas extracelulares e perivasculares” – com os cães a apresentar padrões mais semelhantes aos dos humanos, enquanto nos gatos o padrão das placas é mais difuso.

A disfunção cognitiva nos animais de companhia tem sido mais estudada nos cães que nos gatos. Sabe-se que qualquer raça de cães pode desenvolver disfunção cognitiva

No entanto, João Carlos Ribeiro sublinha que “parece haver uma maior prevalência em fêmeas, animais esterilizados e, possivelmente, também em cães de pequeno porte”.

“A disfunção cognitiva nota-se em, aproximadamente, um em cada quatro cães com mais de 8/9 anos. E vai aumentando com a idade: passa para cerca de um em três após os 11 anos e atinge quase 70% dos cães com 15 ou mais anos”, explica o médico veterinário.

Por outro lado, os gatos apresentam uma incidência “ligeiramente menor”, atingindo cerca de um terço dos gatos com mais de 11 anos, metade dos que ultrapassam os 15 anos.

Um artigo científico, publicado em 2019, afirma que esta condição “é comum em cães mais velhos, particularmente naqueles com mais de 8 anos” e que os “os sinais lentos e progressivos de alteração mental e demência caracterizam o transtorto”.

Num outro artigo, publicado em 2021, avança-se que a “deterioração da cognição (resultando em demência)” está entre “as alterações neurológicas mais comuns relacionadas com a idade”, a par com alterações no “desempenho motor” e “declínio visual e auditivo”.

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Quais os sinais de demência nos animais?

Os sinais de disfunção cognitiva são muito semelhantes aos do envelhecimento, o que pode dificultar o diagnóstico dos médicos veterinários. Os tutores dos animais têm, por isso, um papel importante na identificação e relato dos sinais de demência, principalmente em cães e gatos seniores.

Os dois especialistas consultados pelo Viral enumeram os principais sinais de disfunção cognitiva (tanto em cães como gatos):

  • desorientação/confusão
  • diminuição da interação (com humanos e outros animais)
  • desregulação do ritmo circadiano (ciclo acordado/dormir)
  • perda de memória e desaprendizagem das rotinas
  • alteração do nível de atividade
  • ansiedade

Ângela Martins explica que “os animais podem demonstrar alterações na marcha – começando a andar em círculos ou ficar parados a olhar para um objeto por muito tempo”.

Além disso, continua, “podem não reconhecer a comida, começar a fazer as necessidades em casa (no caso dos gatos, deixar de ir à areia)” e “podem também ter momentos de disforia e hiperatividade durante a noite”.

Nos cães existe uma escala de avaliação (CADES) que permite aos médicos veterinários determinar o nível da disfunção cognitiva. 

Esta escala analisa vários parâmetros, atribuindo numérico aos comportamentos do animal, o que permite determinar se a disfunção cognitiva é leve, moderada ou severa (demência canina).

Como ajudar os animais com demência?

A síndrome de disfunção cognitiva não tem cura, mas o “segredo é detectar precocemente e atuar para travar a progressão”, afirma Ângela Martins. 

A especialista sublinha a importância de uma boa alimentação, de estimular a rotina do animal e de realizar exercício físico regularmente.

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“O sedentarismo vai aumentar a progressão da doença. Os animais que não se mexem têm um envelhecimento precoce e a doença manifesta-se mais rapidamente”, alerta.

João Carlos Ribeiro sublinha que a terapêutica farmacológica apresenta “pouca evidência de melhora do desempenho cognitivo ou na progressão da doença”. 

Por outro lado, “é cada vez mais evidente o benefício do enriquecimento cognitivo, melhorando o desempenho cognitivo e retardando a progressão da doença, tanto em humanos como nos animais”.

“Nos animais, este enriquecimento baseia-se na estimulação física e cognitiva através de passeios frequentes e reguladores (mais aplicáveis aos cães) e na introdução permanente de atividades e brinquedos novos”, aponta.

Os tutores de um animal com disfunção cognitiva devem ter cuidados extra para “proteger os animais de problemas adicionais” que possam advir da desorientação, descoordenação e perda de visão ou audição. 

Deve também ser evitada a “exposição a situações perigosas” – como declives ou escada sem monitorização – assim como “o contacto não vigiado com pessoas e animais que possam resultar em agressões”.

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20 Fev 2024 - 10:13

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